Todas as varas finas estão cortadas, assim como os cipós.Restam daquilo que foi capoeira densa, as árvores grandes. Sigo orientação para cortar as árvores pela frente e por trás a favor do mandado. Não entendo. Mas observando os que sabem. golpeiam para derrubá-las para onde desejam que elas caiam.. O corte pela frente é mais baixo, o de trás mais alto, sempre a favor do vento. Nesta altura outros machadeiros, com mais experiencias, escolhem algumas árvores frondosas para derrubá-las explicando que são os paus dos mandados. Quando são muito grossas, uns machadeiros cortam pela frente e outros cortam por trás até derrubá-las sobre as demais, que vão caindo num barulho ensurdecedor. Umas árvores gemem, outras teimam em não cair; deixando os machadeiros, que nesta altura estão bastante suados, com raiva e medo de que não voltem. Segundo explicação; quando os paus dos mandados voltam são um perigo causando a morte dos trabalhadores, pois trazem com eles outras árvores que estão entrelaçadas nos cipós. Cícero me chama para que puxe um cipó enquanto ele tenta derrubar uma árvore teimosa, outros ajudam, mas uma porção de árvores despenca no chão.
Uma embiara! - exclamou Raimundo. Tobias apontando para o oco de uma árvore. Quem sobe para ver o que é? As sugestões são diversas, até que se chega uma conclusão que é um quandú e depois que a árvore cair mata-se com o tiro. A árvore é derrubada em vez de um quandú, são dois.Enquanto um é morto a tiro o outro foge embrenhando-se no meio do roçado já derrubado. Raimundo encarrega-se de preparar a embiara e no outro dia trazer para que todos comam. Nunca tinha visto um quandú. O que me admirou é a quantidade de espinhos que servem para sua defesa quando atacado. No dizer de Raimundo, quando mais se puxa mais entra. Pergunto intrigado - como se tira? Raimundo responde - cortando a parte que fica de fora para sair o ar, mas perigoso mesmo é em cachorro quando pega o bicho que solta uma grande quantidade enfiando por todo o corpo, causando-lhe a morte.
Nem todas as árvores caem sob a organização de mandado, quando isso ocorre, elas são derrubadas individualmente por alguém escolhido para esse fim. Sou escalado para derrubar uma touceira de sabugueiro, são duas horas da tarde, o sol é quente, minha roupa está ensopada de suor, minhas mãos, embora não mais tenham vestígios de calo, ainda doem. Bebi grande quantidade de água, mesmo coma recomendação de que quando se está em derrubada não se come muito. nem se bebe muita água. Começo a cortar. Os golpes não são como os de meus companheiros, eles são acostumados, eu não. A medida que corto, o suor aumenta. Algumas árvores caem, outras teimam em não cair se agarrando umas ás outras. Tento cortar, mas conforme se dão os golpes abrem-se fendas, soltam resina, que parecem ser sangue. Sinto a cabeça rodar, a vista escurecer, aos poucos vou caindo no tronco de uma árvore, vejo estrelas, mosquitos, pássaros, marimbondos. Não sinto o sol nem a roupa molhada de suor, minhas mãos não ardem, é silêncio, a árvore já não cai, os machados não cortam não ouço os gritos dos companheiros, gritos de vitórias quando derrubam o pau do mandado; gritos que soltam acrescidos de gargalhadas quando são ferrados por formigas ou marimbondos, grito de aviso: Turma tá na hora de quebrar o jejum e amolar ferramenta e beber água, almoçar!
Também aprendi: quando o machado de um silencia, grita-se por seu nome para saber se aconteceu algo. Ouço o grito dos companheiros se aproximando e ajudam-me a levantar, mandam que eu tire a blusa encharcada de suor e me fazem sentar ao pé de uma árvore e com a maior naturalidade dizem: deu cara branca! Comeu muito, bebeu muita água, foi trabalhar no sol. O comentário fica por muitos e muitos anos. A derrubada terminou. Resta esperar que seque para atear fogo. encoivarar e plantar. A rotina de trabalho continua.
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